quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Amanhece devagar ...

 

















Depois de um sono acalentado pelos murmúrios da maré-cheia, cativa dos rochedos semeados ao longo da orla norte de Vila Praia de Âncora, é salutar saltar da cama quente e sondar o tempo, ainda envolto num luar sublime, que logo transmite um sentimento misto de liberdade e magia.

Narciso adora madrugar, sempre que está junto do mar, levantando-se com o crepúsculo matutino. Gosta de sentir a fresca brisa da alvorada, admirar os pescadores de proximidade que, com as suas barcaças, pontilham o oceano com luminescências da faina piscícola e de desfrutar as características fragrâncias da maresia temperada com a fauna marginal ao oceano.

Fica encantado a olhar o constante vaivém do mar, lá mais ao fundo, e a respirar todos aqueles aromas antes de iniciar a caminhada, pelo passadiço, até Moledo do Minho. 

Faz questão de assistir ao nascimento de mais um dia neste vilarejo, aguardando o raiar do sol sentado no alto paredão fronteiro ao mar. É dali que avista a foz do Minho com a imponente Ínsua, pequena ilhota de granito com fortificação marítima, classificada como monumento nacional e que continua a sua missão de vigilância e proteção da barra do rio.











No regresso, cruza-se com caminheiros apressados, quase todos de semblante sonolento e cabelos desordenados. 

Outros andarilhos. de marcha mais tranquila, carregam mochilas que denunciam a demanda a Santiago de Compostela. Parece que todos estão compenetrados na missão de festejar a vida com aquele exercício matinal.

Durante o percurso, Narciso sente a liberdade aumentada, deleita-se com as ventanias soltas e rebeldes, frui de um recolhimento morno e fagueiro e descansa o olhar nas paisagens azuis a perder de vista.

É aí que mais sente saudades do futuro, sobretudo quando a maresia lhe entra pela alma dentro prenhe de odores mágicos do restolho da flora, que ladeia o caminho, evocando memórias ancestrais carregadas pelos genes.

São momentos inesquecíveis, aqueles: o contacto com a natureza e o assombro do mar. 

Narciso respira os cerca de sete quilómetros com as preocupações do quotidiano ausentes do seu espírito. Porque, por ali, o dia amanhece devagar ...

CG