sábado, 31 de dezembro de 2011




A TODOS OS VISITANTES DESTE ESPAÇO DESEJO UM 2012 
QUE CUMPRA TODOS OS SONHOS
E EXPECTATIVAS. 

Carlos da Gama

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Saudade a tiracolo!


                                                                                                     Foto: Google Imaagens       


Já lá vão alguns anos que vi partir o cantor de intervenção que preencheu a rebeldia da minha juventude: Adriano Correia de Oliveira. 
Uma voz fantástica que imortalizou as «Trovas do vento que passa» escritas pelo poeta de excepção, então exilado, Manuel Alegre.
Num tempo em que a ditadura fazia o seu caminho, amordaçando as liberdades aos mais variados níveis de intervenção económica, social e politica do povo português, eram homens como estes que teimavam em manter acesa a chama do inconformismo e da resistência.

Adriano foi um exímio intérprete do fado de Coimbra e um preponderante elemento da geração de cantores da resistência ao Estado Novo, conhecida como música de intervenção. 
Lembro que cheguei a deslocar-me a Lisboa para o ouvir, numa festa anual do partido político em que ele militava. E de ficar deslumbrado pelo seu excepcional timbre de voz que inundava de vertigens a alma de todos os que o ouviam.
As cantigas do Adriano segregavam fortes emoções onde o sonho ganhava a dimensão das utopias construídas nos tempos juvenis. 
Ao ouvi-lo cantar, o meu pensamento vagueava por entre brumas de indignação pelas injustiças e repressão dos povos amordaçados por tiranetes de ocasião.

                                                                                                     Foto: Carlos Carvalho        
Fazendo jus ao mito de que «morrem cedo os que os deuses amam», Adriano desapareceu, precocemente, no decurso do Outono de 1982, com apenas 40 anos de idade. 
Parece que aguardava que a aurora libertária da Revolução do 25 de Abril de 1974 se consolidasse para se permitir partir para outra dimensão. 

Ficou-me gravado na memória a capa do «single» de canções que, imediatamente ao seu desaparecimento, alguns amigos reeditaram, como homenagem póstuma, em que o Adriano surge, em toda a sua imponência, a caminhar por uma longa estrada, de costas voltadas e com a viola a tiracolo. 
A partir deste ícone, sempre que o Adriano emerge da minha alma, pela magia da sua voz, retenho essa metáfora da nostalgia que sempre existe na partida para outros destinos. 
É assim que me vejo quando também decidir partir: de costas, caminhando pelo espraiado do mar e com a saudade a tiracolo.

 Carlos da Gama

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Por sobre as águas!

                                                                                                                                                                                                                                                      Foto: Carlos Carvalho        



Já tinha uns dez anos quando olhei o mar pela primeira vez. Não o tinha, até então, ainda gravado na memória de afetos. Talvez pelo facto de nesses tempos recuados o mar não possuir o fascínio que à época me inspirou.
Lembro bem, foi para os lados de Vila do Conde, mais precisamente, na praia de Azurara, junto à foz do Ave, que o mar se recolheu na minha alma.
Retenho, bem presente, o intenso cheiro da maresia que, então, o oceano exalava. E a magia dos sons das ondas que se espraiavam em abundante espuma branca. Esse deslumbramento permanece em mim, apesar da fluidez do tempo.
Eram felizes os dias passados no colégio em época de veraneio. A noite era dominada pela ansiedade da espera da partida para Azurara. Ali chegados, era um «ver se te avias» para mais rapidamente chegar junto do mar. E para ali ficava deslumbrado pela grandeza do oceano e fascinado pela gigantesca energia que exibia. Gostava de permanecer junto dos pescadores e admirava a facilidade com que os peixes eram enganados com os iscos atirados para as águas inquietas pelo encontro do rio com o mar.
Foi na foz do Rio Ave que nadei pela primeira vez num inusitado atrevimento de passagem para a outra margem. Ainda hoje sinto a vertigem do terror que se apoderou de mim quando tive que batalhar com pés e mãos para me aproximar de terra firme. Esta leviana aventura, que poderia ter desaguado num destino fatal, acabou por se transformar numa conquista de futuro. Porque foi a partir daí que passei a fruir de um dos meus maiores prazeres: a liberdade de andar por sobre as águas!

   Carlos da Gama

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

frio ...


Gosto de ver a erva clareada pelo gelo da madrugada. Gosto de sentir o frio que exala deste tempo de hibernação. Gosto de apreciar a natureza em pousio.
                                                                                                                                                        Foto: Carlos da Gama        
A temperatura está agreste. Sempre que o sol se faz anunciar em dia de Inverno, o frio é seu parceiro favorito. 
Vejo as pessoas a caminhar de corpo hirto, como que para quebrar o gelo do frio com que se confrontam. 
Sente-se uma frescura gélida que parece querer entranhar-se corpo dentro. 
Todos exalam fumos de respiração. Apesar dos primeiros raios de sol da manhã oferecerem um acolhimento que ameniza o frio.
Dói-me a alma quando olho os rostos gelados dos que estendem a mão à caridade dos transeuntes.
Debaixo do mesmo céu, todos os seres humanos deveriam ter garantido o conforto necessário a fazer face aos rigores do tempo. 
Infelizmente não é isso que se passa e a sociedade dos nossos dias tem aprofundado as desigualdades entre os que têm facilitado o acesso aos recursos e os que não dispõem de meios para garantir o mínimo de qualidade de vida.
Esta nossa sociedade não tem emenda!

  Carlos da Gama

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Bucolismo

                                                                                                                                                                                                                                                                                      Foto: Carlos da Gama        



Toda a vida do ser humano é fruto de encontros e desencontros. E, sem qualquer alarido, ela vai-se alterando à medida que o tempo passa e molda-se às épocas e circunstâncias. 
De princípio, é a vontade que comanda a gesta e a atitude. Com a maré-cheia do tempo o corpo vai tomando as rédeas dos dias de forma inexorável.
Levamos uma vida inteira a procurar a felicidade e muitos chegam ao fim com a sensação de que ainda não a encontraram na plenitude. Sem entender que ela é sobretudo uma magia de pequenos momentos que transporta para um estádio de bem-estar aos mais variados níveis. Como confirma a canção, «a vida é feita de pequenos nadas»!
Li, algures, que os dias andam devagar mas os anos passam depressa. Vivemos tão ofuscados pelas modas sociais que nem nos apercebemos que a felicidade encontra-se à esquina da nossa própria existência. Só que, pela vertigem do tempo, nem sempre reparamos nela.
Passei o fim-de-semana natalício em casa de familiares, junto da Foz do Cavado. Local de beleza sem par que desfrutei nos silêncios semeados pelos frescos campos que acompanham as margens do rio. Os verdes que a natureza me ofertava contrastavam na perfeição com outras cores e matizes que o Inverno tem semeado por este Minho de encantos.
As árvores, despidas de folhas, exibem os ramos nus em prece continua para os céus, como que implorando que a hibernação dê lugar a um tempo menos exigente. A paz que se respira por ali facilita a contemplação do rio que serpenteia pelo vale até á foz. Este bucolismo da mãe natureza é o quadro perfeito para o despertar dos sentidos.

   Carlos da Gama

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Entardecer


                                                                                                                                                                                                           Foto: Carlos da Gama        


Pelo entardecer, na penumbra do dia
Ergo meu olhar para o céu encoberto
Pressinto uma névoa na alma vazia
Talvez de tristeza que anda por perto!

Depois da vertigem, prossigo viagem
Semeando ao vento saudades sem cor
Sempre a maresia, sempre esta miragem
De sonhos nostálgicos em eterno clamor!

Antes de romper com as rotinas do dia
A Luzinha brilhante vai ao lado da lua
É em ti que eu navego nesta idade tardia
Meu rio de afectos, de afagos e ternura!

Caminho por estradas quase adormecidas
Por negras paisagens com a luz a morrer
As sombras do vento são bem parecidas
Com os nobres silêncios deste entardecer!

  Carlos da Gama

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

NATAL À BEIRA-RIO







 











É o braço do abeto a bater na vidraça?
E o ponteiro pequeno a caminho da meta!
Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,
A trazer-me da água a infância ressurrecta.

Da casa onde nasci via-se perto o rio.
Tão novos os meus Pais, tão novos no passado!
E o Menino nascia a bordo de um navio
Que ficava, no cais, à noite iluminado...

Ó noite de Natal, que travo a maresia!
Depois fui não sei quem que se perdeu na terra.
E quanto mais na terra a terra me envolvia
E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra.

Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me
À beira desse cais onde Jesus nascia...
Serei dos que afinal, errando em terra firme,
Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia?

David Mourão-Ferreira - Obra Poética 1948-1988

sábado, 17 de dezembro de 2011

Tão próximo do céu!



Foto: Google Imagens 


O inverno aproxima-se de nós com os dias cada vez mais curtos. E com escassa luz. 
Há dias em que o sol surge apressado. Aparenta, até, ter medo de permanecer um pouco mais. 
Chego a pensar que, além de áspero, rude e ventoso, o Inverno deve ser mal-humorado com o próprio sol.
Na serra, o horizonte apresenta-se muito próximo. 
O céu termina já ali no cimo daquele monte careca de granito. A noite veste-se de breu e cai abruptamente. Os silêncios cercam-na para deixar que uma calmaria bucólica regresse ao vale das veigas de Lamas de Mouro.

Daqui, da casa rolante de aventura, assisto à passagem inexorável do tempo na companhia do «Guardador de Rebanhos» que se fez heterónimo de Fernando Pessoa - Alberto Caeiro. 
A noite continua lá fora na companhia do frio, do vento e da abundante chuva miudinha. A madrugada desperta, de mansinho, com o rumor lento e cadenciado do trote dos cavalos selvagens. E ao som dos chocalhos dos rebanhos madrugadores e das vacas de pele ocre e de longos chifres.
Foto: Google Imagens 

A manhã de sol frágil que só se permite aparecer por entre frestas de nuvens carregadas de água negra. 
Pressinto a sensação fria do lago que recolhe os sedimentos que escorrem da montanha em correria louca pelos ruidosos rápidos de água abundante.
E admiro a beleza das árvores típicas daquele Parque Nacional, santuário de espécies únicas de fauna e de flora. 
Apesar de despidos, os vidoeiros alinhados erguem os braços na direcção do céu, como que implorando aos deuses um tempo mais ameno.
É tão bom acordar no alto desta fantástica paisagem de montanha e dar de caras com uma multiplicidade de cores da agreste fauna que emerge por entre penhascos graníticos que fazem o horizonte tão próximo de nós. Tão próximo do céu!

  Carlos da Gama

Magia do pão-trigo

 
A Cáritas é uma organização não governamental, pertencente à Igreja, criada com objectivos eminentemente pastorais em meados da década de cinquenta do século XX. 
As suas primeiras actividades centraram-se, fundamentalmente, na distribuição de géneros alimentares pela população portuguesa naquele tempo de penúria que se seguiu à segunda guerra mundial.
Nos nossos dias, as Cáritas Diocesanas têm plena autonomia e personalidade jurídica própria com exclusiva dependência do bispo da respectiva diocese. 
E a Caritas Portuguesa é membro da Caritas Internacional, que é a confederação de 165 organizações católicas de ajuda, de desenvolvimento e de serviço social de todo o mundo.
Foto: Google Imagens 

Nos tempos recuados da minha infância, lembro bem da acção da Caritas nas aldeias do meu país, um dos mais pobres da Europa Ocidental.
Ainda hoje delicio-me a cheirar o pão-trigo, com retardo de um ou dois dias, num ritual que me inspira essa época de sonhos e afetos.
Recordo bem que, todas as manhãs, antes da abertura da escola primária, as crianças dirigiam-se à Quinta do Sr. Faria para ali beber leite em cocas de latão, acompanhado com um pão com queijo ou marmelada. 
Todos aqueles produtos eram fornecidos pela Caritas a uma das famílias mais abastadas da minha aldeia com a responsabilidade de os redistribuir pelas crianças em idade escolar.
Aquele cheiro do pão já recesso ficou impregnado na minha memória de afetos. A ponto de, ainda hoje, sentir prazer em abrir o pão trigo e aspirar aquele mágico odor que me conduz, de imediato, àquele tempo feliz que foi a minha infância.
Este hábito de abrir o pão-trigo e de aspirar o odor que exala, tem sido demasiado notado pelos meus mais próximos conviventes que sempre me questionam a razão daquele ritual. 
Mas é um impulso irresistível esta forma de reviver uma época que, apesar de difícil, evoca emoções que ficaram impregnadas na parte mais feliz da minha memória de vida.

Sempre gostamos de regressar às origens, mesmo que seja através da memória dos sentidos. Mas não gostaria que este meu país voltasse a precisar da ajuda desta Organização na alimentação saudável das crianças com a abrangência que tinha à época. 
Porque isso representaria um regresso ao indesejável limiar da pobreza.
Apesar de tudo, sinto prazer na descoberta de memórias da minha infância quando o sentido do olfacto desperta na magia do pão-trigo.

  Carlos da Gama

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

O lenho do Natal!

  
Foto: Google Imagens 



Nestes dias, frios de Dezembro, respira-se um perfume de festa da ternura, que é o Natal. 
Apesar dos tempos de crise económica, financeira e social, os rostos brilham um pouco mais e sempre se procura ter por perto os afetos de proximidade.
Este é, também, um tempo de memórias. 
Em que gosto de recordar o Natal da minha infância, envolto numa aura mágica que, ainda hoje, me incute saudades.
Cinquenta anos constituem um espaço temporal que faz toda a diferença. Nesses tempos recuados da nossa memória, a televisão era um luxo de poucos, a rádio constituía um acesso de alguns e o telefone resumia-se em ser uma miragem para a grande maioria. Coisas tão vulgarizadas no mundo dos nossos dias!

Porque vivia na idade da infância, a noite de Natal tinha outra ternura. O centro do convívio era a lareira, alimentada com os melhores cabeços das velhas oliveiras ou possantes carvalhos, previamente cortados para a ocasião. 
Após o repasto das batatas e do bacalhau, regados com o vinho dos pipos, abertos no momento, a conversa alongava-se pela noite dentro, enquanto se assavam as «maçãs da porta da loja» que alguns, mais audazes, introduziam nas aquecidas malgas de tinto.
Lembro bem que os mais novos jogavam ao «rapa, tira, põe e deixa» com os pinhões, recolhidos das pinhas mansas que o braseiro tinha já desflorado com a força do calor.
Todos aguardavam a chegada da meia-noite, hora a que, supostamente, o Pai Natal desceria pela chaminé para deixar as prendas nas botas cuidadosamente arrumadas por ali. A confiança era tanta que, numa noite de Natal, um dos meus irmãos teimou, convictamente, que tinha visto a perna do Pai Natal a subir pela chaminé acima.
Recordo, também, a minha perplexidade perante o critério daquele velho de barbas brancas na distribuição das prendas. Porque não conseguia entender o facto de, ano após ano, serem beneficiados os meninos pertencentes às famílias mais abastadas. 

Apesar da extraordinária mudança, nas últimas décadas, a nível das condições económicas e sociais, nada é comparável ao fogo de emoções que me incutia o lenho do Natal!
  Carlos da Gama

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Para lá da bruma!





    Foto: Carlos da Gama        

 







Esta nostalgia que enche de mansinho
Todo um vazio que explode no peito
Como um grito de vozes em desalinho
Corre pelas margens em que me deito!

Pressinto fantasmas em vez de esperança
Prevejo borrasca nesta vida sem norte
Nos horizontes que a vista já não alcança
Não bastam as asas que me fazem forte!

Ai, esta imensa sina que me trás cativo
Este viver que mais é que de saudade
Vivo a madrugada como poema perdido
Pressinto fortes ventos da iniquidade!

Os anos passaram na angústia sofrida
Os dias se foram entre luz de espuma
Foi longa a espera da maresia sentida
E a fuga dos sonhos para lá da bruma!

Nesta tempestade que inquieta a alma
Importa resistir e chegar a bom porto
Com os afectos que me incutem calma
Com eles crio minha zona de conforto!

  Carlos da Gama

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Chegar, estar e partir!


                                                                                                                                                                              Foto: Google Imagens        
                                                                 


Ao alongar o olhar, no conforto da vidraça do meu gabinete, concentro-me nas árvores despidas no frio invernoso que confirma o mês de Dezembro.
E interrogo-me da razão deste aparente paradoxo. Então, não seria mais óbvio que, tal como fazem os humanos, as plantas reforçassem a sua protecção com mais pétalas e ramagens?
Esta contradição, que mais parece um sacrifício oferecido aos deuses, deixa-me perplexo.
Uns alvitram que, dessa forma, a natureza evita o Inverno partindo para uma hibernação de três meses. Ou seja, viaja para um contexto de penumbra e esquecimento de forma a não sentir os rigores gélidos dos dias longos de escassa luz. Desaparece, dizem, por uns tempos, para emergir em apoteose logo que os primeiros afagos da Primavera se fizerem pressentir.

Vivi, durante alguns anos da minha adolescência, num colégio religioso que ficava para os lados do Porto. Defronte ao Colégio situava-se um lar de idosos de pessoas abastadas, quase todas ligadas à área do comércio. Gostava de o visitar amiúde, pela exuberância da flora que aquele enorme recinto exibia e pelo contexto acolhedor que a casa de repouso oferecia.
Lembro bem da mobilidade fácil e dos sorrisos dos velhos, que ali passavam o resto da sua vida, quando o tempo estava de feição. Mas, também, retenho, na inquieta memória, que o Inverno tinha o condão de aproximar a morte dos mais frágeis. Quase diariamente testemunhava a partida de mais um residente daquele paraíso. O número de partidas era tremendo nos meses em que a natureza se lançava nos braços da hibernação.

É fácil conformarmo-nos com a tese de que está a ser cumprida a lei da vida, que se manifesta no ciclo de chegar, estar e partir! O corpo lá se vai resignando com a perda de vigor pela passagem dos anos. E o espírito acomoda-se, de igual forma, a este ciclo da vida humana que muito se assemelha às estações do ano.
Uma das teses de promoção da saúde mais propaladas nos últimos tempos é a de que importa dar mais vida aos anos do que mais anos à vida. Ou seja, o importante é a forma como vivemos e não o tempo que vivemos. Na certeza de que este intervalo da nossa existência, que chamamos de vida, resume-se a este fantástico ciclo de chegar, estar e partir!

  Carlos da Gama

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Conforto!

O tempo curto deste Inverno frio de montanha faz com que a tarde pareça já velha de idade e vestida de penumbra húmida e de cinzento-escuro.
O sol, frágil de luz e já posto no horizonte, parece corar de vergonha, certamente, por não ter a necessária potência para aquecer este tempo de hibernação dos seres da natureza.

Pelo passeio marítimo de Vila Praia de Âncora, caminha gente apressada, talvez, na procura da mobilidade pretendida. Ou de formas corporais que a moda impõe.
A uns escassos metros, um casal de anos pousa o olhar no oceano e olha o pôr-do-sol que ilumina o horizonte rectilíneo deste imenso lago que nos prende a atenção. 
E uma gaivota emerge lá ao longe no contra-luz moreno de tardio.
Mais gente caminha na longa marginal. Conversam entre eles, certamente, sobre a vida agreste e a incerteza que se aproxima, a passos largos, do meu país de contrastes sociais.
Lá em baixo, as ondas esforçam-se por se aproximar da areia, num contínuo movimento de teimosia. Deslumbram pelo esbranquiçado de espuma que se agiganta quando batem de frente nas rochas altaneiras.

Há um silêncio no ar que se faz ouvir neste entardecer de rumores tardios. Há magia na luz cor de fogo que o horizonte oferece de presente. Um escasso tempo de fruição!
Lá fora, a roupagem dos transeuntes denuncia o frio trazido pelo vento norte. A Micha faz-se porto seguro perante as temperaturas mais agrestes, gerando um ambiente deveras acolhedor.
Apesar de tudo, há momentos em que apetece sentir o fresco do ar no rosto da aventura, sobretudo, quando o mar está de feição. Como este mar que admiro da janela deste conforto!

  Carlos da Gama
              Foto: Carlos da Gama

Sons de viagem!




Sinto-me, por vezes, grávido de festa
Quando deambulo por estas paragens
Amo estes sons do ventre da floresta
Quando tropeço em giestas e ramagens!

Como furacão que irrompe à procura
Busco notícias nos ventos cor de mar
É neste contexto que a magia perdura
E nas águas serenas que amo navegar!

É este o destino que sempre sonhamos
Nos dias frescos da fugaz mocidade
Restam as memórias do que viajamos
Para lá dos horizontes e da liberdade!

  Carlos da Gama

                 Foto: Google Imagens     

domingo, 11 de dezembro de 2011

É aqui!


 
Lamas de Mouro, outrora uma freguesia cheia de gente, está quase deserta. Soube que permanecem, por ali, cerca de vinte residentes. 
Grande parte dos nascidos naquelas terras de montanha, ou partiram para outras paragens, ou preferiram abraçar o sono da eternidade. 
A montanha é de uma beleza sem par. Mas só com muito esforço se consegue obter o sustento. Por isso, no passado, algumas famílias mudaram-se para Braga, onde passaram a residir e, quase todos, a prosperar. A maioria abalou para o Canadá, EUA ou o centro da Europa.

Estive aqui, pela primeira vez, há cerca de 31 anos, na semana fatídica da tentativa de resgate dos reféns norte-americanos no Irão, pela fracassada Operação «Eagle Claw» no dia 24 de Abril de 1980.
Foi, também esse, um tempo de incerteza para o mundo e de profundas alterações estratégicas na geopolítica dos Estados Unidos da América. 
Foi uma semana de sonho que passei, com os meus principais afectos, acampado nas Veigas de Lamas de Mouro, junto da Casa Abrigo que ainda hoje repousa por ali.

Parece que foi apenas ontem que visitei esta parte nobre do Parque Nacional de Peneda-Gerês. O tempo, por aqui, é eterno e permanente!
Ainda ali está a relva onde colocamos a tenda, de feitio índio, tendo como cenário gigantescas árvores de cúpula verde azeitona. 
Ainda corre a água límpida e gélida no riacho que lhe está de frente. Continuam puros os ares desta montanha acolhedora. Apenas não podemos acender as fogueiras com a liberdade do passado.
Os cavalos selvagens continuam a anunciar-se pelas veigas. Passa uma viatura de longe a longe. O silêncio é perfeito, porque cheio de sons que a natureza acomoda. O paraíso existe, de facto: é aqui!

  Carlos da Gama

                  Fotos: Google Imagens     

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Silêncios de ouro!





Foz do Neiva, meio-dia!
Chegamos há cerca de duas horas. Subimos o passadiço dunar, para olhar o mar do alto da falésia. 
Lá ao cimo, um banco de madeira fronteiriço convida a saborear o oceano que se remexe num contínuo murmúrio de paz. 

Junto ao banco, um casal de namorados iniciava um aquecimento que haveria de terminar em frenesim de abraços, beijos e de mútua entrega dos corpos à liberdade dos sentidos.Tive pena de ter surgido por ali, precisamente, naquele momento. Mas … há caminhos onde só existe retorno após cumprida a liturgia. E o mar estava ali aos nossos pés, deslumbrante de calmaria e de leve rumor, apesar da costa estar pejada de pedras roliças.

Após o passeio pela margem do Neiva, até à foz, o silêncio invadiu-nos até ao âmago. Já há muito que não me sentia como que em levitação e fruindo de uma paz búdica que só se encontra por aqui neste tempo de hibernação geral.
O escasso casario que aqui foi plantado, quase todo vocacionado como abrigo de veraneio e de final de semana, completa um cenário todo feito de bem-estar e de desejada solidão.

O Rio Neiva corre, lentamente, por entre juncos e canaviais após deixar, mais a montante, os campos de regadio. 
Na foz, este manso curso de água alarga-se um pouco mais deixando formar umas pequenas ilhotas no seu seio, guarida das gaivotas em tempo de digestão e sesta.
Neste momento, pressinto o rio engrossar pela força da maré cheia. 
Aqui e ali ouvem-se os sons dos peixes que saltitam, talvez de satisfação pela abundância de nutrientes ou pelo paraíso que lhes coube na sorte.

Não há vivalma por aqui. Apenas uns rafeiros se aproximam da Micha, porventura, atraídos pelos cheiros gastronómicos que a Tonicha confecciona neste momento.
Estendo a vista pelo casario, postado mais ao longe, para os lados de Castelo do Neiva, num quadro multicolor que embeleza os montes que aconchegam o produtivo Vale do Neiva. E, uma vez mais, sinto o silêncio quieto, búdico e acolhedor. Parece, até, que o tempo parou para melhor fruir desta paisagem de sonho.

Há momentos, confessava à Tonicha que estes retintos silêncios embebedam-me a alma. E que, talvez, seriam em demasia se cá ficássemos vários dias. Ripostou-me com um «Ainda teremos saudades destes silêncios!».
Dou-lhe razão. Porque é neste contexto que consigo olhar para dentro de mim com maior desassombro. É neste silêncio que sinto a alma a crescer. Sem dúvida que a vida ganha mais sentido no meio destes silêncios de ouro!

  Carlos da Gama

                  Fotos: Google Imagens     

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Dezembro!




 

Dezembro recomeça em nossas vidas

Mês do frio, dos souvenirs e do consumo

Tempo que desperta emoções perdidas

Ou apressadas pelas catedrais do mundo!


Daí que eu prefira o tempo de ternura

A que mais desejo achar junto do mar

Ou no espraiado de sonho e aventura

E na liberdade das gaivotas ao voar!

  Carlos da Gama

              Foto: Carlos da Gama