quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Saudade a tiracolo!


                                                                                                     Foto: Google Imaagens       


Já lá vão alguns anos que vi partir o cantor de intervenção que preencheu a rebeldia da minha juventude: Adriano Correia de Oliveira. 
Uma voz fantástica que imortalizou as «Trovas do vento que passa» escritas pelo poeta de excepção, então exilado, Manuel Alegre.
Num tempo em que a ditadura fazia o seu caminho, amordaçando as liberdades aos mais variados níveis de intervenção económica, social e politica do povo português, eram homens como estes que teimavam em manter acesa a chama do inconformismo e da resistência.

Adriano foi um exímio intérprete do fado de Coimbra e um preponderante elemento da geração de cantores da resistência ao Estado Novo, conhecida como música de intervenção. 
Lembro que cheguei a deslocar-me a Lisboa para o ouvir, numa festa anual do partido político em que ele militava. E de ficar deslumbrado pelo seu excepcional timbre de voz que inundava de vertigens a alma de todos os que o ouviam.
As cantigas do Adriano segregavam fortes emoções onde o sonho ganhava a dimensão das utopias construídas nos tempos juvenis. 
Ao ouvi-lo cantar, o meu pensamento vagueava por entre brumas de indignação pelas injustiças e repressão dos povos amordaçados por tiranetes de ocasião.

                                                                                                     Foto: Carlos Carvalho        
Fazendo jus ao mito de que «morrem cedo os que os deuses amam», Adriano desapareceu, precocemente, no decurso do Outono de 1982, com apenas 40 anos de idade. 
Parece que aguardava que a aurora libertária da Revolução do 25 de Abril de 1974 se consolidasse para se permitir partir para outra dimensão. 

Ficou-me gravado na memória a capa do «single» de canções que, imediatamente ao seu desaparecimento, alguns amigos reeditaram, como homenagem póstuma, em que o Adriano surge, em toda a sua imponência, a caminhar por uma longa estrada, de costas voltadas e com a viola a tiracolo. 
A partir deste ícone, sempre que o Adriano emerge da minha alma, pela magia da sua voz, retenho essa metáfora da nostalgia que sempre existe na partida para outros destinos. 
É assim que me vejo quando também decidir partir: de costas, caminhando pelo espraiado do mar e com a saudade a tiracolo.

 Carlos da Gama

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