sábado, 31 de maio de 2014

Como náufrago, sorvo a vida ...


Vista de Saint-Jean de Luz - França


Este é um tempo propício
A visões, mesmo inquietas
Ondas do mar em bulício
E frugais brisas despertas

Aquela época distante
Que persiste a suspeitar
É uma luz de alma errante
Que não consegue alumiar

Alma minha de vendavais
Minha velha fantasia
Há vida com sal a mais
Nesta viagem já tardia

Chego aqui como um navio
Depois de tanto peregrinar
Ao chegar nasce um vazio
Que não consigo explicar

Como náufrago, sorvo a vida
Que emerge à minha frente
Tal como está contida
No pútrido de uma semente

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Nuremberga




Nuremberga (em alemão: Nürnberg) é a segunda maior cidade da Baviera. 
A cidade destacou-se em todo o mundo por ter sido um dos principais locais usados para os vários comícios efectuados pelo Partido Nazi. 
Ficou mais conhecida, ainda, após a Segunda Guerra Mundial, quando aconteceu o famoso julgamento dos principais responsáveis pelos crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
Não será de estranhar, pois, que, ao chegarmos a esta cidade, o pensamento estivesse povoado de cenários de horrores cometidos na Segunda Guerra Mundial.

Visitamos, em primeiro lugar, o Centro de Documentação, que fica dentro do Complexo do Congresso do Partido Nazista.
Nuremberga, considerada uma das cidades mais importantes para o regime nazi, era onde aconteciam os mais importantes encontros e comícios dos membros do partido. 
O espaço era um local de culto nazi, quer para a demonstração de poder, quer para a mobilização de massas em torno do seu Führer. 
Era por ali que aconteciam as pomposas marchas do exército perante Adolf Hitler, o chefe supremo. 
Este acompanhava tudo da tribuna principal, construída especialmente para que ele pudesse discursar e ser ovacionado como se tratasse de um verdadeiro deus.

O Julgamento de Nuremberga aconteceu em 1945, no Palácio de Justiça onde foi instaurado um tribunal militar na célebre sala 600. 
Nessa época, Nuremberga encontrava-se na Zona Americana de ocupação.   
Era, pois, da responsabilidade dos americanos o controlo do julgamento, a vigilância dos acusados, para além de toda a segurança do local.

Pernoitamos no «Volkspark Mariemberg». Um amplo espaço verde, muito frequentado pelos locais, quer para andar de bicicleta ou de patins, quer para simples caminhadas pelos estreitos caminhos de alcatrão ladeados por relva a perder de vista, habitada por árvores de várias espécies.
Vêm aos grupos, munidos de fogareiros e demais pertences, para um pic-nic na relva que, neste dia, o sol beija em contínuo. 
Ali ao fundo, um conjunto de pessoas, de vestes orientais, entretêm-se com a cerimónia do chá que ali será bebido na companhia de bolos trazidos de casa. 
Se assim é em dia de trabalho, imaginamos o movimento ao fim-de-semana.
Ao entardecer, as fumarolas emergem de todos os lados, sinais de que por ali a carne já assa nos fogareiros. 
E à sua volta pululam os comensais numa confraternização amiga, embrulhada num tempo morno e verdejante!

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Soufflenheim






Estamos à porta da Alemanha. Numa pequena Village que vive essencialmente do turismo e do artesanato.


As casas são feitas de barrotes  de madeira cruzados entre os quais é colocada argamassa para que as paredes ganhem consistência e beleza.


É uma vila muito florida e em cada porta se anuncia a venda de artesanato de cerâmica característica desta região.


A AS de autocaravanas, construída pelo município, é no centro da Vila e oferece todos os requisitos para uma boa permanência. 

Uma simpatia francesa a que já nos habituamos.


Pela manhã, deixamos esta linda cidade e retomamos a estrada rumo a Nuremberga, na Alemanha.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Colmar



Viajamos cerca de 300 kms para chegar a Colmar, uma cidade da Alsácia, encostada à Alemanha. 

A chuva, que nos visita pela primeira vez nesta viagem, obriga-nos a permanecer por mais tempo no interior da Micha. 

Mas, até que ela é bem-vinda porque a AC estava bem necessitada de um banho após oito dias a rolar.

O percurso foi de paisagens memoráveis. 

As florestas da Alsácia são de vegetação multicolor e as aldeias aninham-se por entre as árvores com os seus telhados quase até ao chão e de matizes escuras, predominantemente ocres. São autênticos postais ilustrados.

Colmar é uma cidade de médio porte e, talvez por isso, algo confusa para o viajante de primeira água. 

Não conseguindo encontrar a AS que tinha colocado no GPS (porventura errada!), pernoitamos no largo estacionamento do E. Leclerc.

Ao visitar esta região, pela primeira vez, constato que os nomes das localidades são, quase todos , de tez germanófila.

Tal não será por acaso, pois, a região da Alsácia-Lorena foi sendo disputada pelas armas alemãs e francesas. 

Em plena Segunda Guerra Mundial, a Alemanha Nazi ocupou a região em 1940 e só com a vitória dos Aliados é que a França reconquistou este território.


sábado, 24 de maio de 2014

Châlon-sur-Saône



O percurso de Oradour-sur-Glane até Châlon-sur-Saône é de uma beleza a que nos surpreende a cada momento. 

A estrada serpenteia por montes e vales verdejantes de primavera. E o nosso olhar deleita-se nos cenários que se alteram continuamente.


De quando em vez, os campos a perder de vista, vestem-se de amarelo que, no meio do verde, constrói uma paisagem paradisíaca. 
Chalon-sur-Saône, comuna francesa situada no Departamento Saône-et-Loire, da Região da Borgonha, é uma bela surpresa. 

O rio Saône alarga-se frente à cidade permitindo uma navegação de barcos de médio porte. 


A catedral de Saint-Vicent, construção do séc. XI, é um ex-libris que completa a principal praça, também ela de traça arquitectónica medieval.
A sua fachada, destruída na Revolução, foi reconstruída a partir de 1822 seguindo neogótico.


sexta-feira, 23 de maio de 2014

Ourador-sur-Glane – os limites da ignomínia



Pernoitamos em Rochefoucauld, uma pequena vila a caminho de Limoges. Admiramos o seu ex-libris – o castelo que se ergue na colina norte e domina toda a paisagem. 
O rio que lhe beija os pés aumenta-lhe a mística do encanto de outras eras.
No dia seguinte, bem cedinho, rumamos para Oradour-sur-Glane, onde chegamos pelas 09.30 da manhã. 
De imediato, dirigimo-nos para o Centro de Memória que honra os heróis do massacre de 10 de Junho de 1944, perpetrado por 200 alemães das SS nazi.  
No final da guerra, as ruínas foram mantidas pelo governo francês, liderado pelo Presidente, Charles de Gaulle, como memória desse crime e símbolo do sofrimento causado pela ocupação nazista.

O que nos é dado observar é uma tragédia sem razão. E as palavras para descrever o sentimento que nos invade fogem de nós como que envergonhadas por crime tão bárbaro.
Imaginem uma vila francesa com mais de 600 habitantes, 180 dos quais eram crianças. 
Imaginem que, a propósito de uma qualquer acção da resistência francesa ao ocupante nazi, uma força de cerca de 200 soldados, das temíveis SS nazis, decide cercar a vila pelas 14.00 horas do dia 10 de Junho de 1944.
Imaginem que todos os habitantes foram chamados para a rua e, após um breve interrogatório, os homens são executados em frente das suas casas. 

Imaginem que as mulheres e as crianças são arrastadas para o interior da Igreja da Vila, sob o pretexto de serem melhor protegidas. 
Imaginem que a Igreja é encerrada e é incendiada e que, quem ousasse fugir daquele inferno era, de imediato, executado.
Imaginem que, depois dos homens, mulheres e crianças serem executados, os militares alemães entraram em cada casa, pilhando tudo o que tinha valor e executando aqueles que, ou por medo, ou por doença ou, ainda, por velhice, não puderam ou não quiseram sair de suas casas.


Imaginem que a maior parte dos edifícios de Oradour foram destruídos após o massacre da população. 
Imaginem que, ao todo, nessa fatídica tarde foram executados 642 habitantes de Oradour-sur-Glane. 
E que apenas se terá salvado uma mulher que conseguiu escapulir-se da Igreja sem que fosse vista e alguns residentes que naquele dia não se encontravam na Vila.
Depois disto, o que dizer?
Como é possível cometer-se um massacre como o que aqui teve lugar? Que ideais e que demónios confluem numa direcção tão abjecta e inumana?
Por muito esforço que faça, não encontro respostas. 
Mas neste momento vem-me à memória outros massacres semelhantes de que muitos povos foram inocentes protagonistas. Entre outras atrocidades em vários países, não esqueço a que ocorreu na aldeia Moçambicana de Wiriyamu (Província de Tete), que foi totalmente arrasada e queimada e os seus habitantes todos chacinados por uma força do exército português, ao tempo da guerra colonial. 
O motivo e a barbárie foram semelhantes.
O memorial de Oradour-sur-Glane lembra com tristeza as maldades que o ser humano é capaz de fazer ao seu semelhante.
Ao calcorrear as ruas do que resta da antiga Village de Oradour, imaginei o curso da normalidade da vida de homens e mulheres, naquele mês de Junho, e a algazarra das crianças brutalmente interrompida pelo terror do hediondo regime da Alemanha nazi. 
E lembrei-me do que ouvira num recente documentário na TV sobre o holocausto dos judeus: o que mais impressiona não foi a desumanidade dos nazis, mas a humanidade daqueles homens e mulheres do exército alemão para com a sua família depois de tratarem os outros como trataram. Custa a compreender que tenha sobrado alguma humanidade familiar àqueles seres que tão barbaramente assassinaram, com requintes de cobardia e malvadez, milhões de inocentes.

sábado, 10 de maio de 2014

Biarritz



 


Praias cheias de surfistas. Mar mais verde numa larga tira e de azul-marinho já na distancia. 
Casario espalhado pela colina exibindo uma variada tela cromática, quase todas as maisons vestidas de riscas a fazer lembrar a Costa Nova do meu país. 
Placas informativas bilingues numa afirmação de continuidade da região basca por terras de França. Verde de relva espalhado por todo o lado, hoje, acompanhado de um sol primaveril que convida a um passeio pela marginal. Estamos em Biarritz!
Uma bela cidade encostada a Bayonne. Os inúmeros castelos e palácios da «belle epóque» emprestam um especial glamour a esta região preferida da burguesia francesa.
O tempo está de feição, o que tem facilitado umas boas caminhadas pela majestática marginal.
E sabe bem olhar o mar, lá muito ao fundo, constantemente agitado pela maresia breve e por muitos jovens que por ali surfam a liberdade de brisas frescas deste mar tão acolhedor.

Vitoria-Gasteiz









Tarde morna na capital do país basco. Viemos de Palência onde pernoitamos, uma vez mais, na área da «Isla Dos Aguas».

Estamos no início de uma viagem na busca de memórias das duas guerras mundiais que marcaram todo o século XX: a primeira ocorrida entre 1914-1918 e a segunda no período de 1939-1945.

Durante a tarde visitamos a cidade de Vitória-Gasteiz que nos surpreende pelo seu «casco medieval», pelas praças históricas e pelas imensas zonas verdes das avenidas novas. 

Mas é o centro histórico que mais nos prende, na admiração da arquitectura passadista, dos palacetes de tempos imemoriais e das catedrais que alberga. 
A mais velha, a Catedral de Santa Maria, encontra-se em restauro profundo pelo que não foi possível admirar-lhe as entranhas.

Sede do governo autonómico basco, Vitória-Gasteiz é uma cidade que deve o seu notável desenvolvimento à abundância de ferro em toda a região basca. Há momentos, visitamos o monumento erigido em memória das vítimas do terrorismo perpetrado pela ETA. 
Impressiona o número de cidadãos inocentes que tombaram às mãos do braço armado daquela organização que, durante décadas, lutou ferozmente pela independência desta região autónoma de Espanha.

Felizmente que, com a prisão dos principais líderes da guerrilha e o consequente abandono, por parte da ETA, de acções armadas, esse tempo de medo parece ter passado á história.