domingo, 20 de setembro de 2015

A vida gasta-se!






"Inventámos um monte de consumos supérfluos e há que continuar a comprar e a deitar fora. 
E o que estamos a gastar é tempo de vida, porque quando compramos algo não o compramos com dinheiro, pagamos com o tempo de vida que tivemos de gastar para ter esse dinheiro. Mas com esta diferença: a única coisa que não se pode comprar é a vida. 
A vida gasta-se. E é lamentável desperdiçar a vida para perder a liberdade."
José Mujica, ex-presidente do Uruguai


segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Oeste ...

Lagoa de Óbidos
À entrada do Parque de Autocaravanas da Foz do Arelho, uma surpresa: está a funcionar uma recepção onde se é recebido com simpatia e se faz a inscrição e o pagamento da estadia.
São notórias melhorias na oferta de condições, já só faltando a disponibilização de pontos de electricidade e investir, um pouco mais, na higienização das estruturas sanitárias.
Foz do Arelho
Apesar das cerca de cinco dezenas de autocaravanas já instaladas, foi possível estacionar de frente para a lagoa, tal a dimensão do espaço disponível. O sol faz parte de um cenário magnífico de um dos locais mais belos da zona oeste do meu país.
Já por aqui estive várias vezes sem conta. Apaixonei-me por esta região quando, pelos meus vinte anos, iniciei a obrigatória fase militar no quartel das Caldas da Rainha. Foi nesse tempo que descobri e admirei a rota turística de grande qualidade composta por Peniche, Óbidos, Foz do Arelho, S. Martinho do Porto e Nazaré.
Foz do Arelho
Mais tarde, por cá veraneei, na adolescência dos meus filhos, ficando alojados nas magníficas instalações do Inatel, cujo edifício principal foi propriedade do filantropo, do início do século XX, Francisco Grandella.
Este industrial dos famosos «Armazéns Grandella», construiu este palácio situado um pouco mais para o interior, debruçado sobre a lagoa de Òbidos, ao estilo neo-manuelino, muito ao gosto da época, e a escola primária que ainda hoje funciona na Foz do Arelho.
S. Martinho do Porto
Reparo que a lagoa está em grande transformação, quer das suas margens, quer do próprio leito, criando melhores condições para a sua fauna e flora, bem como para os pescadores locais que vivem do que conseguem retirar da lagoa.
O tempo tem estado quente e ensolarado, convidando a um passeio pelas margens da lagoa e redondezas das Freguesias Foz do Arelho e Nadadouro. Espera-se que assim continue!

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Afectos de proximidade!


Um passeio pela praia, ao entardecer, é sempre um exercício de reflexão solitária. Os pensamentos voam como o vento que acaricia o rosto quente por um sol de estio. 
Pousamos o olhar no mar, até ao horizonte, e uma sensação de liberdade entra por nós adentro impelida por um desejo de correr de braços abertos para que a magia do momento se eternize.
Sentimos o mundo artificial bem afastado e esquecido e reconfortamo-nos em paisagens singulares, longe do quotidiano rotineiro. 
São momentos propícios a evocar episódios vividos com intensidade, há mais ou menos tempo. 
Sobretudo, quando o inesperado nos toma por inteiro e imprime marcas profundas e perenes na alma, fazendo a vida ganhar novo sentido.
Ora, o desaparecimento de um dos nossos familiares mais queridos, apesar de expectável pelo tempo vivido, é sempre um momento único de dor e angústia onde a racionalidade se perde num emaranhado de emoções difíceis de controlar.
Os primeiros tempos são de incompreensão sofrida pelo desenlace a que se segue uma contida raiva contra o destino comum, a começar pelos nossos maiores. Depois, o tempo encarrega-se de nivelar emoções e injectar doses de resignação, muitas vezes alojada em crenças num reencontro futuro.
Ruminava tudo isto, há momentos, durante a caminhada junto ao mar de Porto Covo, na companhia de um pôr-do-sol de cores quentes. Mas era a forma como cada um de nós se confronta e reage, perante a adversidade, que mais puxava a minha reflexão.
Diz-se, e eu acredito, que não há maior dor que o desaparecimento de um filho. Mas também asseguro que não há menos dor quando a nossa mãe decide partir em direcção ao infinito. Porque é a ela que lhe devemos a vida e a aprendizagem da ternura e dos afectos que nos qualificam como seres humanos.
Por isso, e não só, sempre pensei que um imprevisto desses funcionaria como cimento, ainda mais agregador, dos filhos, sobretudo quando, até aí, os humores de alguns nem sempre foram consequentes. 
Seria impensável, para mim, que uma tragédia daquelas originasse uma maior separação dos que, até então, estavam unidos, quer na amizade fraterna, quer na atenção com o ser que nos gerou.
A ser assim, quero acreditar tratar-se de um paradoxo do destino, de um absurdo, de uma nova provação, de um equívoco ou seja lá o que for. 
Não se compreende, de todo, a postura de negação que se sobrepõe à continuidade do espírito gregário que, indiscutivelmente, sempre foi o anseio do maravilhoso ser humano que nos deixou.

Ao longo da minha vida, aprendi que se leva anos para se construir confiança e apenas segundos para a destruir. 
Ainda assim, acredito que o tempo faz sempre o seu caminho, qualquer que seja a distância e a circunstância. Sobretudo quando estão em causa afectos de proximidade. Oxalá!

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Luminosidades …







Lagos é, para mim, a cidade da luz. 

Porque a larga avenida, que nos conduz até à fortaleza, é abrigo da marina que se caracteriza pela brancura do seu edificado e dos iates que ali buscam guarida;

Porque o Mercado Municipal reflecte uma maior luminosidade desde que a Sophia de Mello Andersen escreveu, a propósito do mercado de Lagos, onde fazia compras em tempo de férias: «Entra no mercado e vira à tua direita e ao terceiro homem que encontrares, em frente da terceira banca de pedra, compra peixe».
Porque o centro da cidade é um rendilhado de ruas, mais ou menos alongadas e apertadas por um alvo casario de construção centenária;

Porque o seu concelho abriga uma das mais afamadas localidades – a Praia da Luz – muito antes de aí ter ocorrido o trágico desaparecimento da criança inglesa que tanta tinta faz correr.

Lagos  é uma bela cidade que gosto de visitar sempre que o Algarve é destino de viagem. 

É dali que, quase sempre, regresso a casa percorrendo a costa alentejana. 
Desta vez, a primeira paragem é em Almograve. 


Caminhamos alguns quilómetros junto ao mar, admirando as águas límpidas do oceano e o rendilhado das baixas arribas, revestidas de lajedo, de corte longitudinal, parecido com a ardósia.

Por ali, apenas se ouve o silêncio cúmplice da natureza espreguiçada ao sol e o leve marulhar das águas contra a costa.

Seguimos, depois, para Porto Covo, simpática Vila, também ela de uma enternecedora brancura, não estivéssemos no Alentejo profundo.

Apesar de o verão estar quase velho, são ainda muitos os veraneantes que procuram este local. 

Talvez, atraídos pelas águas azul-turquesa que banham as pequenas praias e deslumbram o olhar dos visitantes.

O dia está bem ensolarado, mas sem castigar. 

Uma brisa refrescante perpassa por nós, aconchegando a caminhada pela marginal onde apetece sentar-mo-nos num dos vários bancos e aí ficar a escutar a voz do mar e a tentar perscrutar os mistérios que carrega.

Ao longe, avista-se a «Ilha do Pessegueiro», romanticamente cantada por Rui Veloso, numa trova que nos embala, apesar da trágica história de amor, de tempos imemoriais, que relata.

Mas, mais do que palavras, deixo-vos algumas fotos, como sempre acontece nos post’s  que publico. Porque, como escreveu José Cardoso Pires, no livro «E agora, José?», «… a fotografia vê o que o olhar não abrange, aquilo que a nossa atenção visual deixa escapar ou esquecer».


segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Garimpeiros de areia!




Cá estamos, de novo, no largo descampado da Praia da Rocha. 

Há dias, li num site autocaravanista a notícia de que a Câmara de Portimão teria encerrado o parque. Constato que tal não corresponde à verdade. 

Pelo contrário, este local oferece ainda mais valências, como electricidade e internet, para além de pernoita.

Pelo entardecer, fizemos uma caminhada até ao Vau, pelas arribas donde se avistam paisagens de sonho. 

Praia da Marinha
A tonalidade multicolor das rochas e muros altaneiros, fronteiriços ao mar, dá um especial encanto à Praia da Rocha. 

Beneficiámos, aliás, do mesmo cenário idílico desta manhã quando visitamos a Praia da Marinha, na Lagoa.

Praia da Marinha
A Praia do Vau é famosa, entre outras coisas, por acolher a casa de verão da família Soares, que foi palco de grandes reuniões e azáfamas quando aí eram recebidas inúmeras personalidades políticas e presidentes de vários países amigos de Portugal. 

A casa pareceu-nos fechada e em silêncio, talvez pela proximidade temporal do luto pelo desaparecimento recente da mulher de Mário Soares, a Dr.ª Maria Barroso.
De regresso ao parque da Marina da Praia da Rocha, presenciamos um insólito num dos bares da praia: um casamento em pleno areal com a boda a decorrer num dos bares. 

É assim a vida. Enquanto uns estão ensimesmados a roer mágoas de saudade, outros iniciam-se na doce ilusão de que tudo é eterno. Que dure todo o tempo do mundo!

No dia seguinte, fizemos a caminhada matinal pela borda do mar. 

A praia estava praticamente deserta pelas sete horas, apesar do sol lançar raios de luz e aconchego. Todo o areal tinha já sido alisado pelas máquinas.

Ao longo do caminho, apenas encontramos gaivotas que, impassíveis à nossa passagem, se preparavam para um novo dia. 

Mais ao longe, um homem, munido de um detector de metais e uma pequena enxada, percorre a praia na expectativa de encontrar algo perdido pelos turistas mais incautos. 
Motivado, porventura, pela mesma aventura dos garimpeiros de ouro e diamantes que passam a vida no sonho e expectativa de que um dia encontrarão aquela pedra que lhes trará honra e glória! São os garimpeiros de areia do nosso tempo!

Beleza rara!






De início, ouve-se o pausado piar das gaivotas. Mais ao largo, o marulhar sereno do oceano. 

Depois, o lusco-fusco da madrugada dá, lentamente, lugar ao clarear do amanhecer.


A temperatura está baixa, talvez uns 12 graus centígrados. Mas vale a pena saltar da cama e admirar o nascer do dia na Praia dos Arrifes.

Estão por aqui, espalhados pelo cimo das arribas, cerca de meia dúzia de autocaravanas. 
Algumas velam, ainda, o sono dos seus inquilinos. Outros estão já nas arribas de melhor vista munidos de máquinas fotográficas prontas a disparar.
Parecem caçadores à espera de registar o momento certo para a posteridade.

Abeiro-me da praia e o espectáculo inicia-se com os primeiros raios de luz a encarar o dia. 
O sol vai-se espreguiçando no horizonte mostrando uma cada vez maior auréola avermelhada que se estende pelas rochas ocres características deste Algarve de sonho.

O silêncio é apenas quebrado pelo esvoaçar de um grupo de gaivotas, como que a saudar a chegada da luz do sol. 

São momentos de apoteose da natureza que, pacientemente, aguardou toda a noite para sentir o sol a emergir em todo o esplendor.

A Praia dos Arrifes, pequenina e encaixada num anfiteatro de rochedos amarelos e ocres, é de uma beleza ímpar. 

Ao lado, a Praia de S. Rafael segue-lhe as pisadas.
É um privilégio poder pernoitar por aqui neste fim de verão e beneficiar de mais um dia de sol e calor.



A manhã foi de caminhada pelas arribas na direcção oeste. Por estreitos trilhos, de terra vermelha, passamos por paisagens exuberantes. 

O mar, sempre ao fundo, prefere esconder-se em grutas e anfiteatros gigantescos, para onde os barcos conduzem os turistas. 

Avistam-se, aqui e ali, pequenas praias quase desertas e, na sua grande maioria, de escassa e perigosa acessibilidade. 

A flora, que nos acompanha, exala um característico odor de madrugadora maresia o que ajuda a enfrentar o esforço da caminhada.

A certo momento, não resistimos a descer uma ladeira íngreme para chegar a uma Prainha, cercada por altas arribas, e cujo areal só emerge na baixa-mar, como era o caso. 

Inebriá-mo-nos com o fantástico cenário de areias douradas por um sol oblíquo e de águas azul turquesa invadidas por um grupo de jovens que ali entraram, cada um em seu barquinho, por um pequeno túnel que faz ligação com o largo oceano. Um momento único de beleza rara!



quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Desassossego!




É por estes caminhos que me sinto livre. Que me perco e reencontro!
Gosto de percorrer as estradas da viagem que sempre sonhei. Não interessa se é longe ou distante. Pouco importa se faz sol ou chuva. O que procuro é a magia do improviso destas estradas que percorro como se fosse a primeira vez.
Sempre me surpreendo com uma curva a que se segue um vale verdejante ou uma colina de carvalhos ainda adormecidos. Cada esquina que descubro é um momento único. As cidades e vilarejos surgem-me sempre belos.
É este estilo de vida, de viajante sem destino, que sempre idealizei. Sempre me achei com alma de peregrino e quase sufoco se demoro um pouco de mais tempo entre quatro paredes.
Adoro chegar a cada localidade e inebriar-me com os seus encantos e particularidades. Não me interessam as pessoas e as suas histórias … tão-só os seus olhares misteriosos e as paisagens em que vivem.
Eu sei que, também esta viagem terá um final. Será apenas o tempo de desembrulhar saudades dos meus afectos. Depois, mais cedo que tarde, zarparei de novo. Para sacudir o desassossego!

Alentejo!

«Em cada dia deixamos uma parte de nós mesmos pelo caminho» Amiel

Batalha

Não por acaso, tropeço nesta frase certeira, que requer uma breve reflexão. Colhi-a da página que abre o «Diário Volumes V a VIII» do escritor que há muito teima em ser meu companheiro de viagens: Miguel Torga.

Após pernoitar na cidade da Batalha, onde cheguei já a noite tinha ganho algumas horas, rumei para o parque de campismo municipal de Beja. 


Este lugar não me é estranho. 
Beja

Apesar de passados cerca de 25 anos, em que cá veraneei na companhia dos infantes, tudo continua imutável. 

O tempo foi fazendo o seu curso normal sem que algo mudasse neste recanto do Alentejo profundo. 

Esse foi o tempo de percorrer este admirável espaço português com o «iglo» na bagageira do carro.
Beja


Foram tempos felizes, aqueles! Pena que os miúdos cresçam e voem para outras latitudes enquanto «o diabo esfrega um olho»! Pena que assim seja … ainda bem que assim é!

Li, algures, que os nossos filhos não nos pertencem. Este paradoxo é, ao mesmo tempo, sadio e cruel. 

Sadio, porque o ciclo de vida cumpre-se quando os filhos ganham independência e constroem o seu próprio projecto de vida. 
Mértola

Cruel, porque à medida que crescem, mais se sente a sua ausência no quotidiano das nossas emoções.

Que saudades das gargalhadas infantis da Joaninha quando as histórias que ouvia terminavam em marotice. 
Que saudade de ouvir o Carlitos a perguntar, pela milésima vez, «pai, ainda falta muito?». 
Que saudades das histórias improvisadas e que tanta atenção ganhava aos putos! 
Que saudades do leve sussurro do sono dos meninos pela noite dentro nas quentes noites de luar do meu país!

Mértola



O Alentejo recebe-nos com a sua habitual mornaceira, que junta as pessoas à sombra das azinheiras e chaparros. 

Foi bom de ver os campos, verdes de oliveiras, outrora pintados de cor parda pela produção de cereais. 

Foi agradável conviver com a simpatia ancestral deste povo, agora mais orgulhoso pelo reconhecimento mundial do seu «cante alentejano».
Oxalá assim continue!