terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Fúria mansa!

                                                                           Foto: Carlos da Gama
 
Por este véu diáfano da incerteza,
Na guarida do recomeço da viagem,
São veredas habitadas pela tristeza
As que tenho vagueado sem vantagem!

Vejo-me confundido no meio desta selva
Percorrendo velhos sonhos em jangada
Sinto nesta fuga uma ilusão que navega
Por entre a maresia, até de madrugada!

Quando a aventura é um rio que apetece
Preencher com manhãs de rosmaninho,
Sobra uma dor inquieta que entontece,
Semelhante à fúria mansa em desalinho!

O sonho é um voo de horizontes futuros
Rasante de saudades ensopadas em fel
Transporta aromas de ares mais puros
Como os do cavalo correndo em tropel!

Quem só sabe de medicina ...




                                                                           Foto: Carlos Carvalho        

Um dia, tive a sorte de aceder à obra literária de José Rodrigues Migueis e de ler o seu opúsculo «Um homem sorri à morte com meia cara». 
Muitas vezes, em intervenções sobre a administração da saúde, lembrei a experiência e as palavras deste escrittor para abordar a questão da humanização nos ambientes de saúde.
Naquele livro, o autor retrata a sua experiência, como doente neurológico, num grande hospital universitário dos EUA, onde residia. 
Ali, sofrendo de uma hemiplegia, sentiu na pele a arrogância doutoral de um médico que, imaginando-o um caso perdido, o exibia, de forma soes, aos seus alunos, como se tratasse de mais um número na estatística da morbilidade hospitalar.
Mas, José Rodrigues Migueis, descreve a forma generosa, amável e acolhedora de que foi alvo por parte das jovens enfermeiras. Ou seja, na descrição do tempo que passa naquele hospital, o autor faz o contraponto da visão desumanizada da medicina, pela mão do médico, e a entrega generosa, sorridente e carinhosa do grupo de enfermeiras.

Ainda hoje é assim em muitos ambientes do sistema de saúde português. 
Sente-se uma maior ênfase de arrogância médica e uma proximidade profissional no cuidar, que, em geral, o pessoal de enfermagem pratica.
Na minha recente experiência de internamento, de cerca de oito dias, observei esta dualidade comportamental: quase nem fui olhado pela equipa médica que, após três dias, me visitou no internamento. 
E a novidade que me deixaram, com notada indiferença, foi a de que «nos próximos dias será operado!».  

Ora, perante esta falta de ética na comunicação com o doente, para se perceber a razão da espera e a razão de estar há dias num sofrimento inglório e não haver, ainda, uma data para a cirurgia, apenas esbocei um sorriso irónico. Estava numa situação que não permitia qualquer outra reacção, sob pena de tudo descambar para um indesejável descontrolo.
Não perceberam, ainda, aqueles três sujeitos, o vector fundamental no correcto exercício da medicina: a comunicação com o doente para o informar, quer sobre o seu estado de saúde, quer das perspectivas de tratamento.
Na sua formação académica, não aprenderam o essencial: que a palavra é a principal ferramenta do médico. Nem interiorizaram a mensagem de um dos seus insignes mestres, Prof. Doutor Abel Salazar, - «Quem só sabe de medicina, nem de medicina sabe!».

Estreia hospitalar

Foto: Google Imagens 




Até que chegou a minha vez. 
Após uma queda desorientada, dou por mim ajudado por mão carinhosa de afectos desmedidos. 
Num primeiro momento, um rápido diagnóstico faz sossegar a alma: não existem lesões vitais, pelo que importa correr para o aconchego hospitalar onde os diagnósticos são bem mais confiáveis.

É minha estreia como traumatizado na nova urgência do Hospital de Braga. 
No entanto, poucos minutos após a chegada, apercebo-me que tudo será muito lento. Demasiado lento ...
Os gritos de um pai, no desespero de não ver o seu filho ter um atendimento célere, convencem-me que passarei ali muito tempo até ser atendido.

Após cerca de cinco horas de sofrimento na coluna lombar e na mão esquerda, que não parava de crescer, sou atendido pela equipa médica. 
Desde logo, percebi que a humanização da relação médico-doente não morava por ali, apesar do tratamento preencher os requisitos da norma.
Inúmeras radiografias, à cabeça, coluna lombar e mão esquerda, aconselham o médico a centrar-se na invasiva lesão da mão e a tentar colocar os ossos nos seus devidos lugares. 
A dor que senti foi tão forte que julguei não superar. Só mais tarde, uma Tomografia Axial Computorizada diagnostica que as muitas fraturas no tarso vão precisar de uma cirurgia.
Após cerca de nove horas na urgência, sou encaminhado para o internamento de ortopedia, onde aguardaria a marcação da cirurgia.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Resistir ...

                                                                                                     Foto: Carlos da Gama       



Anoitece …  devagar!
A luz é negra. A espera, desesperante!
De repente, uma candeia permanece alerta,
apesar do lusco-fusco mortiço.

Terra-mar onde sempre
regresso consumido
num inverno seco de gélidos momentos
que revisito…quantas vezes!

Lago maternal, de memórias sadias,
que enternece ...
Companheiro sofrido de um
caminho que derivou num
agitado sonho de espuma.

Vida inundada de águas mornas!

Olho o horizonte, de matizes ocres,
anunciando um novo dia e
confirmando que o desânimo
é o covil dos fracos.

Os sons do silêncio são
mais audíveis!

Resistir é preciso!

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Chuva breve!


Foto: Google Imagens 




Já era esperada.
Fria de gelo,
corredia de vento,
castigo da natureza!

Porque é que
o sofrimento antecede
o conforto?
Porque é que a
semente precisa de
apodrecer para
germinar em glória?

Morre-se para voltar
à vida
num eterno exercício
de solidão!