sábado, 5 de novembro de 2016

Pousio do silêncio

«Aprendi que os imbecis estão mais perto de nós do que nós pensamos»
(Pedro Boucherie Mendes)


De repente, quase sem dar por nada, ei-lo, para ali, lambendo as mágoas de um tempo inquietante, por demais. Quem diria que, em idade madura, toda uma vida densamente mourejada se desfizesse ao vento por entre uma turba sequiosa de renovados sabores e tramas.
Joana
Percebeu, em experiência sofrida, que a vida é uma viagem sempre condicionada pelos encontros ou desencontros. 
E que, à hora menos esperada pela razão, surgem devaneios sórdidos a desassossegar os critérios em que sempre nos confiamos.
Nesses momentos, socorremo-nos de energias residuais para não nos desviarmos do rumo desde sempre traçado.
Constato que cedo incorporou a vertigem sentida pela intriga infame que lhe mereceu sentimentos de menosprezo. Mas sei que aprendeu com os seus «maiores» que, mais do que anatematizar certa direcção de afectos, o melhor é compreendê-la na sua circunstância e contexto psicossocial. Daí que, apesar de tudo, prefira relativizar o modo e a circunstância, navegando pela bela história de amor que esteve na origem do seu advento. 
Há muito que deixou de se ralar com questões filosóficas do tipo de donde vimos e para onde vamos. Porque é já distante o tempo do reacondicionamento dos afectos. Escasseia o fôlego e a coragem para o redesenhar dos sentidos.
Confirmo que a defesa da dignidade da sua alma gémea continua a ser o motor que sempre norteou as suas opções de vida. Mesmo para lá do tempo que ele percebeu definitivo. Pois, para ele, o longo pousio do silêncio permanecerá inerte «forever and ever».
Quanto ao demais, mormente sobre as aleivosias trazidas por ventos desabridos, recolhe-se no que, um dia, escreveu Miguel Torga, «Não há como o tempo para tornar relativos os juízos absolutos».

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