terça-feira, 4 de outubro de 2011

Penteadores de areia!

Ultimamente, tenho aconselhado os meus amigos e mais próximos familiares a não assistirem aos telejornais. Porque estes teimam, em cada dia, a acrescentar depressão à vida, tamanho é o rol de más notícias que debitam. 
Já há muito que me fartei de seguir esses programas noticiosos, optando por me refugiar na internet onde possuo suficiente poder de escolha. 


É verdade que os tempos estão difíceis neste meu país de oito séculos de história. Mas, convenhamos, trata-se de um fenómeno que ciclicamente se repete. Após um período de algum optimismo económico e social, segue-se um outro a corrigir o pretenso viver de dinheiro emprestado. Tem acontecido sempre este fado!
Quem se der ao trabalho de ler o Eça de Queiroz, sobre a situação política, económica e social do século XIX, logo se apercebe das semelhanças com a difícil época que atravessamos. É dele a célebre frase, tão actual nos nossos dias: «Políticos e fraldas devem ser trocados de tempos em tempos pelo mesmo motivo».


Ontem, como hoje, o custo de vida agrava-se a cada dia, o trabalho escasseia e as falências seguem-se a um ritmo assustador. Os pobres ficam mais pobres e uma boa parte da burguesia vive uma pobreza envergonhada. 
O desemprego tem levado à falência de muitas economias familiares e ao desespero dos jovens que vêm o seu futuro adiado.

Mas o povo português sempre soube dar a volta por cima, reinventando a forma de ganhar a vida, fazendo justiça ao significado chinês da palavra crise: uma oportunidade! São muitos os que aproveitam a maré de «vacas magras» para apostar em projectos de futuro. E outros, mais modestos, recorrem-se das mais inusitadas ocupações para angariar o sustento de que carecem.


Há tempos, escrevi sobre a «Quimera do Tio Quico», um sonho semelhante à «Quimera do Ouro» de tempos imemoriais, que levou ao êxito de poucos e à desgraça de muitos. 
Mas outras quimeras, feitas de expectantes alquimias, são prosseguidas um pouco por toda a parte. Pois são insondáveis os caminhos da imaginação do homem.

Há dias assisti, incrédulo, a uma nova forma de angariação de recursos. Em plena praia, deserta de fim de verão, um homem passava um pente pela areia nos locais presumivelmente ocupados pelos veraneantes durante os meses de estio. 
Em cada esforço de varrimento da areia, procurava que no pente ficasse retido algum objecto de valor ou, quiçá, alguns euros por ali esquecidos.

Esta imagem fez-me acordar para a dura realidade económica e o dramático estado social a que o país chegou. 
Senti algum desconforto perante a determinação daquele ser humano que alimentava o sonho de encontrar algo de valor que justificasse o esforço.
E fui invadido por um sentimento de ternura pelos homens e mulheres do meu país que a necessidade transformou em penteadores de areia!

                  Foto:         Carlos  da  Gama

2 comentários:

  1. Fantástico texto.Um dos melhores que já li no blog! Parabéns. bjo

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  2. A minha sincera gratidão pelo comentário que me incute energia para continuar a escrever...
    Bjo

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